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quinta-feira, 11 de março de 2010

SER COMPULSIVO


Olhar em volta e ver gente que não está presa
no visgo desse hábito que me persegue
E tentar imaginar como seria viver sem ter que dar satisfação
à compulsão
Sem fazer minha vida girar paupérrima em torno de uma coisa
que me coisifica. Minha praga, minha peste, minha atração.
Algo que me distancia do humano e me faz funcionar em torno
de um instinto, mas tal instinto nem é meu.
É o que me me dopa, me anima e me definha
É o que me convida e me barra 
E sempre, sempre me seduz. Escraviza.
Arrastando-me anos a fora
Me impedindo de viver a experiência de 
ser livre, de mandar em meu próprio nariz,
boca, estômago e todos os órgãos
que me completam
E sobretudo me impede de mandar em minha própria
mente, em meu desejo.
E assim perco a oportunidade de viver, de ensaiar, de errar, de tentar.
É que nem errar mais posso, já que tudo é tão previsível
Minha rotina é ceder à cadeia, às correntes, ao cansaço.
Tentando transformar essa merda em poesia
Tentando inventar uma explicação inteligente, filosófica se der.
Tentando fazer isso tudo virar política, sociologia, psicologia
Mas no fim das contas não passa de uma merda de escravidão.
um arrastão sem fim
Um jeito de não viver, mas de apenas deitar no leito
do rio da vida e se ver arrastar.
Enquanto isso tento fingir que não é nada disso.
E quanto mais finjo mais o tempo passa e não vivo.
Talvez a outra opção para essa dor seja fingir que não a sinto.
Ou tentar ver nessa morte lenta algum charme. 
Quem sabe?

(Walmir Monteiro, a partir do desabafo de um paciente)
março de 2010

2 comentários:

Cláudia Aline disse...

As palavras chegaram forte em mim ...vejo pessoas praticando a autodestruição e tentando mostrar-se como sendo alguém dentro do simplismo: "aproveite a vida". Quando ,na verdade, destroem a sua existência ao não construir o que poderiam... ao não explorar as possibilidades e ao não superar limites pessoais.
Abraço!

WALMIR MONTEIRO disse...

Concordo plenamente com você, Aline. Vejo como má-fé essas tentativas de minimização da realidade. De repente tudo é bom porque o bom foi excessivamente relativizado. O fato é que chamam de bom o que vivenciam como ruim. Falta autenticidade aí. Ah, ele está aproveitando muito a vida. Será? Talvez esteja totalmente sem forças para viver e na dificuldade de admitir isto entrega totalmente os pontos e tenta transformar sua desgraça em poesia. Mas longe de ser um ato poético (e muito menos heróico), é um ato covarde.
Não que todos tenham que ser heróis, ser covarde também é um modo de ser, tá legal, mas é um modo de ser fraco, um modo de desistir da vida.
Quer desistir da vida, ok, mas diga que desistindo e não que a está vivendo plenamente, porque isso é no mínimo auto-ironia